Segundo a Organização Mundial de Saúde, estima-se que 800 mil pessoas morram por intermédio do autoextermínio forma anualmente, uma a cada 40 segundos, o que equivale a 1,4% dos óbitos totais. Cerca de 78% ocorrem em países de renda média e baixa. Segundo a OMS, apenas 28 países possuem estratégia nacional de combate à morte voluntária. A média global é de 10,7 por 100 mil habitantes, sendo 15/100 mil entre homens e 8 entre as mulheres.
Os dados não são precisos, com exceção dos países que levam a sério a prevenção e o acompanhamento do autoextermínio. De um total de 172 países membros, a OMS considera que apenas 60 países enviam dados de boa qualidade, na maioria, nações desenvolvidas. E é justamente nos 112 restantes que se encontram 78% dos suicídios registrados no mundo.
O Brasil está entre os 10 países do mundo no ranking do suicídio, onde ocorre em média 11.000 casos por ano. E isto é apenas um sub-índice, uma vez que muitos casos não são notificados como suicídio.
O sociólogo Émile Durkheim postulou em seus estudos que o suicídio é um fenômeno social que não dependente de raça, psicologia, hereditariedade e insanidade. Ele também destacou que o suicídio é uma doença da época, de cenários potencializadores, e que a anomia seria a causa principal. Anomia é um estado marcado pela falta de regulamentação, paixões ilimitadas, horizontes infinitos e grande tormento. Acerca disso, Durkheim afirma ainda que se tirarmos do homem tudo o que a sociedade lhe empresta em termos de educação, ele voltará a sua condição de animal. Logo a regulamentação não é apenas um conjunto de regras feito para afrontar quem discorda, mas uma forma de fazer com que os indivíduos respeitando os limites dos outros, aprendam fazer a própria regulamentação de seus limites.
Estamos vivenciando tempos pós-modernos, a era que o filósofo Zygmunt Bauman chamou de tempos líquidos, onde nada é para durar. E ele se não estava se referindo apenas as parafernálias eletrônicas e cia, mas também as relações pessoas, os laços afetivos, os vínculos sociais em prol de um bem comum... Nunca estivemos tão próximos, globalmente falando, de pessoas distantes, assim como nunca estivemos tão distantes das pessoas mais próximos. Estamos vivenciando - ao mesmo tempo - uma multidão e uma solidão.
Este contexto histórico corrobora muitíssimos para o sofrimento psíquico, especialmente dos mais jovens, conquanto estão na fase integral de todas as ebulições neurais, mentais, físicas, emocionais, sociais, religiosas, políticas, afetivas, sexuais, profissionais, educacionais... É a triste geração que se esconde dentro de moletons com capuz e se automutila.
O suicídio é um fenômeno social silenciado pela ignorância, seja política, moral, social e/ou religiosa. A ignorância é tanta que sequer podemos dizer a palavra 'suicídio' sem que ela cause um profundo desconforto. Como se o fato de não dizer, fará com que não exista. Entretanto, precisamos falar abertamente sobre o suicídio. Precisamos urgente tratar da nossa saúde mental do mesmo jeito que tratamos o nosso corpo. A visita a um terapeuta precisa ser vista como algo tão corriqueiro e normal quando ir ao dentista, à academia, ao salão de beleza, ao clínico geral. Precisamos aceitar de uma vez por todas que dor psíquica não é frescura, não é falta de Deus, não é para chamar atenção, não é mente vazia, não falta do que fazer... Dor psíquica é angustia, trauma, luto, desemprego, discriminação, preconceito, bullying, abuso sexual, violências físicas, verbal, psicológicas... Dor psíquica é um 'câncer' na alma, causado especialmente pela falta de liberdade e a usurpação do livre-arbítrio de ser quem se é.
Faz-se necessário que compreendamos que é a não aceitação das diferenças que faz do mundo um lugar horrível. Nós não somos iguais. Nós somos todos diferentes. E é exatamente essa unimultiplicidade do ser que faz dele alguém muito digno de respeito, aceitação e amor.
Em suma: como nos orientou a revolucionária psiquiatra, Nise da Silveira, "o que cura é o contato afetivo de uma pessoa com outra. O que cura é a alegria, o que cura é a falta de preconceito". Então, precisamos lutar por políticas públicas destinadas aos cuidados para com a saúde mental desde à infância até a vida adulta: nas creches, nas escolas, nas comunidades e em todos os bairros.
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