A coisa mais incrível nessa história toda (e tudo que digo é provável com laudos, exames e testemunhas) é que meu filho depois do primeiro surto passou 5 meses e 27 dias sem ouvir às vozes e tudo indicava que ele poderia ter uma vida "normal" apesar do diagnóstico: "Esquizofrenia do tipo esquizoforme concomitante com o uso de tetra-hidrocarbinol"... Mas qual?, ele em sua ânsia de ter a certeza de que era mesmo a maconha que desencadeava os surtos, planejou uma recaída. E no dia do seu aniversário de 20 anos, fumou dois cigarros de maconha. A psiquiatra já o havia alertado que caso isso acontecesse ele enlouqueceria outra vez... Foi isso que aconteceu... E depois de dois meses em Franco Surto Psicótico ele optou pela automorte. Ele deixou toda a sua experiência com o uso da maconha e com o surto psicótico em um manuscrito do qual chamou de "No Jardim de ervas daninhas: pague para entrar e reze para sair".
Não é verdade que ele queria morrer, pois ele amava viver, sorrir, brincar... Mas ele não suportava mais viver daquele ouvindo vozes e vendo acéfalos. Ele não queria morrer, ele só não queria mais sobreviver. É diferente.
Eu gostaria de deixar bem claro que a minha intenção ao relatar essa história não é a de promover debates sobre a legalização e/ou descriminalização da maconha ou quaisquer outras drogas, mas sim, propor a reflexão sobre os riscos da drogadição ativa na adolescência por indivíduos geneticamente predispostos.
Tenho "apanhado" muito com a exposição dessa história, mas também imensamente apoiada. Eu não gostaria que isso tivesse acontecido com o meu filho e eu jamais revelaria as minhas vísceras em público, não tivesse eu a plena certeza do que eu digo. Eu não exporia a vida do meu único filho ao escárnio, se ele mesmo, antes de decidir pela morte, não tivesse feito isso em suas redes sociais de modo a se colocar como exemplo. Eu poderia, agora que não tenho mais problema algum com drogas em casa, seguir vivendo a minha vida tranquila e ignorar o fato de que o exemplo do meu filho pode servir de alerta aos que ainda não entraram na drogadição. Eu poderia. Sim, eu poderia, mas a minha consciência social não me permite.
É preciso que os jovens compreendam que tudo na vida evolui e a cannabis evoluiu também: há trinta anos atrás a quantidade de THC (principal substância psicoativa encontrada na maconha) era de 6% e atualmente é 25% com a média a subir, nos próximos anos, cerca de 13%....). O Centro Nacional de Biotecnologia, numa uma revisão sistemática atualizada, mostrou que o uso de cannabis em adolescentes e desenvolvimento posterior de esquizofrenia
O estudo teve como objetivo revisar a literatura recente não incluída em revisões anteriores e verificar a correlação entre o uso precoce de maconha entre adolescentes, entre 12 e 18 anos de idade, e o desenvolvimento de esquizofrenia no início da idade adulta. Um outro objetivo foi determinar se a frequência do uso de maconha demonstrava algum efeito significativo no risco de desenvolver esquizofrenia no início da idade adulta.
Foram examinados quinhentos e noventa e um estudos. Os estudo foram analisados utilizando uma série de testes não paramétricos e meta-análise que mostraram uma diferença altamente significativa nas taxas de probabilidade para esquizofrenia entre usuários de alto e baixo consumo de cannabis. E naqueles que não fazem uso de cannabis, as chances são bem menores.
Texto de Clara Dawn, presidente e fundadora do IPAM-Instituto de Pesquisas Arthur Miranda em prevenção à drogadição, aos transtornos mentais e ao suicídio na infância e na adolescência. Texto publicado originalmente em 2014, um ano depois do suicídio de seu filho, Arthur Miranda. Desde então, ela tem se dedico às pesquisas teóricas e de campo.
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